Eu não sou muito de escrever observações, ou explicações sobre meus trabalhos. Mas neste caso achei que merecesse umas anotações livres, para melhor compreensão de todos (mas quem não quiser ler, tem imagens mais abaixo):
Passei 42 dias em Buenos Aires, participando de um programa de residência chamado Arte in Loco com curadoria de Beatriz Lemos e Pablo Terra. O trabalho que desenvolvi estava extremamente ligado à minha experiência/vivência na cidade e à convivência com os outros artistas do programa. Aos poucos juntei livros que comprei na cidade, li e intervi com rasuras; desenhos que fiz das situações que me chamavam atenção na cidade, anotações e colagens que juntos viraram um livro artesanal; minha cama, que era meu único ambiente de privacidade; meu ténis, que foi aposentado na em Buenos Aires; fotografias que fiz de situações especificas da cidade... enfim, reuni tudo isso na galeria de forma que simulasse minha saída repentina, como se eu tivesse acabado de deixar o recinto.
De maneira geral os elementos deste trabalho discutem as liberdades e privações a que estamos sujeitos: as fotos são de apartamentos gradeados, praças gradeadas, túmulos gradeados, animais no zoológico; li o livro "Los Isleros" e nele fui riscando com uma caneta cada linha, cada página, uma a uma, deixando apenas algumas palavras e frases que de alguma maneira se referiam a questões como liberdade, prisão, guerra, o comportamento de um 'islero'...estas palavras que restaram, lidas de uma vez, dão outro sentido ao livro, um pouco mais poético; os desenhos e anotações de alguma maneira mapeiam ironicamente a arquitetura da cidade evidenciando os dispositivos de isolamento dos cidadãos, além de apresentar notinhas e panfletos de lugares por onde passei; a cama é de fato uma cama do hostel onde fiquei , e fiz questão de manter as adaptações realizadas para ter um pouco mais de privacidade e escuridão. Mas esta configuração, que consiste em utilizar cobertores como cortinas, tanto pode ser de uma viajante num hostel como de um condenado na prisão. Os prisioneiros fazem o mesmo em suas camas. Mas eu não vou ficar aqui falando muito. Vejam as imagens.
"Com intervenciones en libros comprados em las calles porteñas, Daniel sintetiza el sentimiento de soledad de un viajante (ou un islero) que tiene como único puerto seguro el lugar en el que reposa. De esta manera, la cama del hostel El Aleph se configura como un refugio al que el artista nos invita a entrar. Fotos y dibujos encuadernados como libro confidencian instantes passados aquí, como un diario de a bordo repleto de vestigios y resquicios de viaje."
trecho do texto escrito por Beatriz Lemos
agradecimentos a Joana Traub Csëko e Juliana Gontijo pelas fotos e a Loreto Garin, artista de BA que me ajudou a montar o livro.
Confiram mais sobre o Projeto Arte In Loco em: http://inlocoproject.blogspot.com/